À MESA COM OS REIS

sábado, março 05, 2011

Depois de uns dias em "silêncio", cá estou de novo para vos falar um pouco de História. Não da história das comidas, mas das Comidas e dos Hábitos de Comer na História de Portugal.
Eu já tinha ouvido dizer (ou lido algures) que a rainha D. Filipa de Lencastre, mulher de D. João I, tinha vindo encontrar uma corte primitiva e abrutarrada, quando veio para Portugal. Ora parece que afinal não era nada assim! E para prová-lo, vou transcrever um pouco do livro de Manuel Guimarães, À Mesa Com a História.

"São conhecidos os regulamentos e as organizações em vigor nas cortes dos reis de Portugal, desde D. Afonso Henriques, garantidos por oficiais-mores, responsáveis pelo bom funcionamento da vida palaciana, sem descurar a vida íntima da família reinante, nem sacrificar os direitos do povo no acesso ao soberano.
D. Sancho I bebia por copa de oiro, da qual mandaria fazer uma cruz e um cálice, furtando-se assim à ira de Deus e do Papa Inocêncio III, que o acusava de manter em casa uma bruxa, com a qual se aconselhava em assuntos de Estado. No reinado seguinte, D. Afonso II vê-se na necessidade de criar, por decreto, em 1211, um "uchão", funcionário responsável pelos víveres, e um "escanção", encarregado da copa real, também chamado copeiro, patrão de todas as bebidas.
Cabe no entanto ao senhor D. Afonso III (o Bolonhês), o gigantesco príncipe que se dizia ser português pela vida e francês pela comida, a grande reforma da corte dos afonsinhos portugueses. O paço tinha nesta altura padeira privativa - a regueifeira d`el-rei - e um trem de cozinha que exigia nada menos de quatro mulas para carregar tachos, panelões e trinchantes, quando a corte viajava pelas terras de um Portugal recém-nascido.
Não seria numerosa a corte portuguesa no reinado de D. Afonso III. Em 12 anos - de 1258 a 1270 - o rei gastou na sua casa 1845 vacas (8 por mês), 5163 porcos (23 por mês), mais de 10000 carneiros, além do peixe fresco e seco, destinado aos dias magros, o que abona o apetite dos que tinham o privilégio de comer à mesa do rei, por certo inventores do ditado popular: "melhor é migalha de Rei que mercê de Senhor".
Depois veio o rei-poeta, D. Dinis, cantor e cortesão, casado com a Rainha Santa (D. Isabel de Aragão).
Enquanto a esposa jejuava duas partes do ano a pão e água e, no tempo restante, só comia uma refeição diária, o régio esposo dava grandes banquetes no Paço da Alcáçova, onde se comia à mão em baixela de oiro e prata que o rei menciona no testamento, "entre copas, vasos e pichéis, escudelas, bacios e talhadores, companheiros dos prazeres deste mundo e que ninguém, até hoje, conseguiu transferir para o Além".
Menos poeta e por isso menos requintado, o filho da Rainha Santa e do trovador D. Dinis, comia na cama e comia prodigiosamente, o que muito impressiona Mr. Robert Southwell, um anémico embaixador inglês, que não achou maior maravilha em terra portuguesa do que a gula de D. Afonso IV.
Outro protagonismo histórico reservava o destino a seu filho e sucessor, D. Pedro I. Fernão Lopes, um cronista que deixou escritas duras verdades sobre as manhas deste rei, classificou-o como viandeiro, "sem ser comedor mais que homem". Gostava de festejar na rua com o povo, mandando assar vacas inteiras, distribuir montanhas de pão e vinho que chegasse para aguentar uma noite inteira de festas e de danças.
Com D. Fernando, adivinhava-se em tudo, até na mesa, a crise em que o fraco rei lançava a nação. O rei era pouco dado a comidas, embora fosse o primeiro a comer em mesa de estrado, mais alta do que as mesas dos restantes convidados.
Assim se vê que D. Filipa de Lencastre não teria encontrado na corte portuguesa o tal atraso repugnante que alguns pretendem."

E para terminar deixo-vos uma receita fácil, rápida e muito gostosa, para um bolo que poderão fazer para o lanche de um destes dias de férias de Carnaval.

Bolo de Natas

4 ovos
igual peso de açúcar
igual  peso de farinha
1 colher de chá de fermento em pó (Royal)
1 chávena de natas (creme de leite - Br.)

 Ligue o forno a 180°. Junte a fermento à farinha e reserve. Unte uma forma redonda.
Bata os ovos com o açúcar até obter um creme grosso e esbranquiçado. Junte de vagar as natas e vá envolvendo com a colher de pau. Com a ajuda de um passador de rede vá deitando a farinha, em chuva e envolvendo cuidadosamente a massa. Deite na forma barrada com margarina e leve ao forno por 25 a 30 minutos. Faça o teste do palito.

Notas:
- Uso natas Longa Vida (1 pacote)
- Gosto de bater as natas em chantilly, com 2 ou 3 colheres de açúcar. Depois envolvo no creme de ovos e a seguir envolvo a farinha. Fica sempre bem!

Tenham um óptimo fim de semana com muita alegria e paz.

Beijinhos da

Bombom (Tia Fátima ou Avó Fátima)

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6 comentários

  1. Ora, Bombom, mas quanto reinado de comilanças na terrinha!
    Deviam ser todos muito gordos e gulosos.
    Enquanto isso, como ficava o povo desses reis tão gastadores?
    Quanto ao bolo de natas so fiquei na dúvida com relação às natas, pois seriam natas do leite ou o próprio leite, quem sabe o que conhecemos aqui por creme de leite?
    um otimo carnaval para ti e muitos beijinhos cariocas.

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  2. Olá amiga Fátima "Bombom",

    Que saudades de entrar no teu ESTAMINÉ e ler o que tão bem escreves, tens andado fugida, mas eu sei, pois de vez em quando precisamos. Agora em relação à História fiquei deliciada e eu que em miúda nunca gostei de História, dizia: não me interessa o que os Reis faziam...ok, grande erro meu, afinal até gosto e muito! E tu contas a História muito bem, pois transportas-me para o "tempo" dela quando te leio. Mas agora só te digo uma coisa: se D. Pedro I viesse de novo cá queria morrer logo de novo...pois ia encontrar umas vacas anorécticas para um Povo tão esfomeado infelizmente... mas não quero falar de política num cantinho tão delicioso. Adoro o teu bolo de natas, pois é como eu faço o meu, e sei e comprovo que é um bolo deveras delicioso e que aguenta (se aguentar) muitos dias e sem secar.

    beijinhos com muito carinho

    Isabel de Miranda

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  3. Querida Bombom, adoro quando escreves sobre a história de Portugal. Aguça-me minha memória ancestral...acho que já vivi por essas terras em outras vidas, se é que as houve...hehe
    Os povos da Europa sempre achavam que seu país era menos imundo e mais rico...no entanto, sabe-se que na Idade Média e mesmo depois, era tudo uma porcariada só em toda a Europa, pois hábitos de higiene não havia quase!
    Li um livro chamado Sexo com Reis que conta as estórias dos reis e suas concubinas, não é um livro erótico, é um livro histórico, embora o nome o faça parecer assim...mas é de dar engulhos, como os reis e toda a corte eram imundos...e isso em toda a Europa, nenhum escapava da imundície! Beijos, adorei tb a receita...avisa à Beth que natas é o nosso creme de leite, pois não?

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  4. Ébom lembrar momentos da nossa história,obrigada pela receita,beijinhos

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  5. Querida Bombom
    Senti a tua falta.
    Admiro muito a tua cultura, és muito inteligente.
    Esse bolo de natas parece bem fácil de fazer, gostei muito.
    Um abraço apertado
    Léia

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