O FORAL MANUELINO DE CASTELO BRANCO
terça-feira, novembro 29, 2011 Como "nem só de pão vive o homem", hoje trago-vos um pouco de História de Portugal.
Depois verão como está relacionada com a vida do dia a dia, com o pão e outros alimentos, com práticas e atitudes...
No dia 1 de Junho de 1510, o Rei D. Manuel I concedeu foral novo à cidade de Castelo Branco, que na altura se chamava Castelbranco.
No dia 1 de Junho de 2010 passaram 500 anos sobre essa data e a Câmara Municipal , para a assinalar, editou um livro muito interessante sobre esse tema, da autoria do Historiador Leonel de Azevedo.
Tive ocasião de o adquirir no Verão passado e gostei muito.
O livro está escrito numa linguagem muito acessível e é muito interessante.
Sabiam que já nesse tempo se pagava portagem ?
No tempo do rei D. Manuel I já muita gente se queixava porque os Forais antigos pelos quais se regiam, estavam escritos em latim bárbaro que já ninguém entendia, muita legislação tinha sido alterada ao longo dos tempos e muitas moedas tinham caducado. Além disso, como os escritos eram antigos, muitos estavam rasgados, escritos entre linhas e prestavam-se a diversas interpretações, nunca beneficiando as populações e sim, os grandes arrendatários das terras.
Por isso, entre 1500 e 1520, D. Manuel I procedeu a um complexo processo de reforma.
Primeira página - Apresentação e títulos de D. Manuel I
"A quantos esta nossa carta de Foral dado à vila de Castel branco virem, fazemos saber... que nossas Rendas e direitos se devem aí enquadrar na forma seguinte:
Paga-se na dita vila e termo (limites) pela açougagem de cada talho de carne a peso, um quarto de carneiro por ano e mais Cinquenta Reais que o alcaide mor terá de receber e será obrigado a vistoriar (os talhos e açougues) à sua custa.
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Determinações Gerais para a Portagem
Primeiramente declaramos e pomos por lei geral em todos os forais de nossos Reinos, que aquelas pessoas têm somente de pagar portagem em alguma vila ou lugar se não forem moradores ou vizinhos dele. E se, de fora do tal lugar e termo dele (seus limites), tiverem de trazer coisas para aí vender, têm de pagar portagem. Ou se os ditos homens de fora comprarem coisas nos lugares onde assim não são vizinhos nem moradores e as levarem para fora do dito termo.
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Também declaramos que todas as cargas que adiante vão postas e nomeadas em carga maior, se entendam que são de besta muar ou cavalar. E por carga menor se entenda carga de asno. E por costal, a metade da dita carga menor que é um quarto da carga da besta maior.
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Portagem
De todo o trigo, cevada, centeio, milho, painço, aveia, e de farinha de cada um deles ou de linhaça;
E de vinho, vinagre ou sal e de cal que a dita vila e termo trouxerem homens de fora para vender ou as comprarem e levarem para fora do termo, se pagarão por carga de besta maior (cavalar ou muar), um Real.
E por carga de asno que se chama menor, meio Real. E por costal que é metade de besta menor, dois ceitis e daí para baixo em qualquer quantidade quando vier para vender, um ceitil. E quem levar para fora de quatro alqueires para baixo, não pagará nada nem precisa de declarar (à portagem).
E se as ditas coisas ou outras quaisquer vierem ou forem em carros ou em carretas, contar-se-à cada um por duas cargas maiores, se das tais coisas tiver de se pagar portagem.
Coisas de que se não paga portagem
A portagem não se pagará de todo: pão cozido, queijadas, biscoito, farelos, ovos, leite nem coisa dele (lacticínios) que seja sem sal.
Nem de prata lavrada, nem de pão (em grão) que trouxerem ou levarem ao moinho, nem de carnes, vides, carqueja, tojo, palha, vassouras, nem de pedra. Nem de barro. Nem de lenha, nem erva. Nem carne vendida a peso ou a olho, nem se declarará, a menos que seja para vender, quer sejam vizinhos ou não. Nem se pagará pelas coisas que são nossas nem das que quaisquer pessoas trouxerem para seu uso, ou feitas a nosso mando ou autoridade. Nem de pano ou fiado que se mandar fora a tecer, curar ou tingir. Nem dos mantimentos que os caminhantes na dita vila ou termo comprarem e levarem para seus mantimentos e de suas bestas, nem dos gados que vierem pastar nalguns lugares passando.
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Isto foi só uma pequena amostra, porque depois o Foral especifica todas as transacções possíveis na época e o respectivo pagamento à Coroa e à Villa.
Uma coisa muito interessante é ver como se procedia na perda ou achado de gados perdidos, o pagamento por se cortarem madeiras ou cortiça, as penas de armas nas brigas de rua, ou simplesmente quais os alimentos que se usavam nessa época (vem referido o ruibarbo, por ex.).
O livro está escrito em português arcaico e eu tentei "traduzir" para português mais actual, mas é difícil consegui-lo a 100%.
Desejo-vos um resto de semana feliz.
PS: RECADO para Dodoca do "Brechique da Dodoca":
Deixei resposta ao seu comentário no 1° post sobre Sementes Comestíveis. Não consigo comentar no Brechique. Tenho um ficheiro para si, mas não tenho o seu e-mail.
Beijinhos da
Bombom (Tia Fátima / Avó Fátima)
4 comentários
Muito esclarecedora esta sua postagem, Bombom. A história é muito fascinante e sua tradução foi, para mim, perfeita! Enviei um e-mail pra você. Espero que o receba e que o problema dos comentários seja resolvido.
ResponderEliminarBjssssssssss, quérida!
Oi, Bombom!
ResponderEliminarMuito interessante esse resgate que o livro traz. A sua tradução foi perfeita, entendi tudo.
Gosto de História, e me fascina saber a origem das coisas...
Obrigada por esta partilha.
Grande abraço
Socorro Melo
Olá, muito elucidativo este seu
ResponderEliminarpost. Na terra onde nasci
Alhos Vedros,concelho da Moita,
distrito de Setúbal também há
um Fural e aqui é comemorado
todos os anos(de há uns anos para
cá).
Os portugueses sempre pagam,ou de
uma maneira ou de outra,não é?
O pior mal é a maneira como é
gerido pelos políticos.
Beijinho
Irene
Querida Bombom
ResponderEliminarAchei excelente a tua tradução, entendi bem!
Ótimo post, são coisas que nunca parei para pensar!
Um abraço
Léia